Muito prazer, Dr. José Afonso Sallet

Perfil Por Conexão Médicos - 10/03/23

Nascido na pequena cidade gaúcha de Coronel Bicaco (RS), o Dr. José Afonso ganhou o mundo e hoje é reconhecido como um dos maiores especialistas em cirurgia bariátrica aqui e no exterior. Além de ter liderado a implantação do Centro de Excelência em Cirurgia Metabólica e Bariátrica do Hospital Vitória Anália Franco, do UHG, ele ajudou outros centros do gênero no Brasil, América Latina e em países asiáticos, como Japão, Coreia do Sul, China e Hong Kong. Apaixonado por sua profissão, ele também reserva tempo para outros prazeres, como curtir paisagens bucólicas e a vida no campo. Confira a entrevista.

Por que optou pela especialização em Gastroenterologia Cirúrgica?

Desde pequeno tinha noção exata de que queria fazer cirurgia. Desde que entrei na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Santa Maria, sempre dei grande atenção às matérias cirúrgicas. Depois dos estágios do 5º e 6º anos na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e na Santa Casa de Porto Alegre, vim para São Paulo para fazer residência em Cirurgia do Aparelho Digestivo, com a equipe do Prof. Henrique Walter Pinotti, da USP, que também atuava na residência médica do Hospital 9 de Julho. Junto, fiz residência em Endoscopia com a equipe do Dr. Arthur Parada. Quando terminei meu ciclo de quatro anos, tive a honra de ser convidado pelo Prof. Pinotti para atuar na clínica privada dele e como preceptor da residência em Cirurgia Digestiva do 9 de Julho. Nesse período, fiz pós-graduação na área de carcinogênese do aparelho digestivo na Unicamp (SP), com orientação do Dr. Nelson Adami Andreollo. Fiquei seis anos na Unicamp, período em que construí pontes com a Universidade de Kyoto, no Japão, país que sempre se destacou nos estudos de carcinogênese do aparelho digestivo. Na Unicamp também colaborei com o serviço de transplante hepático, experiência que ajudou a somar uma formação muito sólida no aparelho digestivo e me preparar para administrar equipes interdisciplinares.

Como iniciou na cirurgia bariátrica?

No final dos anos 1990, comecei a me dedicar mais especificamente à cirurgia bariátrica e metabólica, que na época era ainda vista com um tom de ironia: ‘como fazer cirurgia de obesidade?’ Sai pelo mundo para me formar na área. Fui para México, Estados Unidos, Itália e outros países da Europa para absorver conhecimento em centros que estavam mais desenvolvidos. Em 1999, eu e outras equipes começamos a realizar no Brasil os primeiros procedimentos desse tipo. Inicialmente, eram feitos de modo convencional, abrindo a cavidade abdominal, procedimento bem mais invasivo e que determinava um pós-operatório mais prolongado, com incidência maior de intercorrências. Um divisor de águas importante da nossa atuação na cirurgia bariátrica e metabólica foi que já em 1999 iniciamos esse procedimento com acesso laparoscópico, técnica que mudou o paradigma da cirurgia bariátrica, sendo menos invasiva, com período de recuperação pós-operatório mais rápido e menos intercorrências pós-operatórias. Sem dúvida, essa via de acesso aumentou a segurança e credibilidade nos resultados da cirurgia bariátrica e metabólica.

Quais os principais problemas que levam os pacientes a procurá-lo?

Como tenho um foco grande em cirurgia bariátrica, o principal problema é o excesso de peso acumulado ao longo de muitos anos e doenças associadas, como diabetes e hipertensão. Esse tipo de paciente também tem problemas articulares de joelho, quadril, coluna e outros que afetam a qualidade de vida. Muito antes de ser uma questão estética, a obesidade é um problema de saúde de proporções planetárias. Mais de 40% da população mundial tem algum grau de excesso de peso ou obesidade. Desses, de 3% a 5% têm indicação de tratamento cirúrgico. Com meus cerca de 25 anos de vivência em cirurgia bariátrica e metabólica, tenho mais de 21 mil pacientes operados.

Que diferenciais você considera importantes no atendimento de seus pacientes?

Na vida existem duas maneiras de fazer as coisas: a certa e a outra. Acredito que o que faz a diferença é sempre agir de maneira ética e profissionalmente correta. Quando falamos em cirurgia bariátrica, primeiro temos de seguir rigorosamente os critérios de indicação do procedimento, respeitando os protocolos internacionais. Também precisamos considerar que a obesidade é uma doença multifatorial. Ou seja, ela não é tratada apenas na ponta do bisturi e do grampeador. Para enfrentá-la, precisamos atuar como líderes de equipes transdisciplinares. Na nossa clínica, o Instituto de Medicina Sallet, temos 14 cirurgiões e mais de 20 especialistas na área transdisciplinar, além dos profissionais de gestão e administração. O bom atendimento ao paciente depende da boa coordenação dessas equipes. Eu sempre brinco com a equipe cirúrgica que a parte mais fácil do nosso trabalho é a hora que o paciente está na sala cirúrgica, pois o trabalho árduo é preparar muito bem esses pacientes para o momento da operação e todo o cuidado do pós-operatório. A cirurgia bariátrica precisa ser encarada como o começo de um tratamento cujo acompanhamento é fundamental.

Tem algum marco especial em sua carreira?

1999 foi um ano marcante. Depois de ter participado de várias formações no exterior, me senti preparado para iniciar a cirurgia bariátrica via laparoscópica aqui no Brasil. A partir desse conceito de transdisciplinaridade, montei uma equipe e fundei o Instituto de Medicina Sallet. Já estamos há quase 23 anos em atividade.

Qual seu segredo para relaxar e manter uma vida saudável?

Faço atividade física pelo menos três vezes por semana com a ajuda de um orientador. Também jogo futebol com meus filhos e viajo sempre com a família para conhecer o mundo. Além disso, aproveito o que nos propicia a cidade de São Paulo, essa megalópole cosmopolita que acolhe pessoas que sabem o que querem e valoriza uma coisa que se chama meritocracia. Aqui também tem uma gastronomia e uma cultura exuberantes.

Pode contar uma curiosidade sobre você que poucos conhecem?

Nasci no interior do Rio Grande do Sul, em uma região de agropecuária. Meu pai sempre trabalhou com agricultura e comércio. Com ele aprendi as primeiras lições de relacionamento humano no sentido profissional e comercial. Sempre gostei desse lado mais bucólico do campo, mesmo tendo estruturado minha vida na capital paulista. Porém, o fato de minha esposa ser de uma família do pantanal mato-grossense, me dá oportunidade de ter contato com o campo, lidar com cavalo, gado… Eu sou médico, mas brinco que sou um aspirante a fazendeiro.

Tem um filme preferido?

Gosto de filmes de ação com uma história envolvente. Talvez isso esteja relacionado à minha ascendência italiana. O nome da minha mãe é Itália, não precisa dizer mais nada, né? Meus filmes favoritos são os da trilogia de O Poderoso Chefão. É um maravilhoso apanhado geral do Scorsese e um elenco de babar.

E livro?

Como todo sonhador, vou lembrar livros que marcaram minha infância e certamente me impulsionaram a ser um pouco aventureiro, ir pelo mundo afora. Um deles é o livro do Júlio Verne, A Volta ao Mundo em 80 Dias, que agora já pode ser feita em 80 segundos (risos).

Que tipo de música prefere?

Sou um pouco eclético em relação à música. Mas gosto mesmo de um bom rock and roll. Curto o pessoal mais antigo, como Beatles, Rolling Stones, Black Sabbath e Deep Purple. Brinco que o rock and roll de verdade foi até uma parte do U2. Dali para frente, não curto muito. Adoro também MPB de boa qualidade e, talvez pelo meu lado ‘fazenda’, gosto ainda de sertanejo raiz.

Qual foi sua melhor viagem?

Fiz viagens maravilhosas, mas adoro a Itália. Tenho uma identificação muito grande com o país. Não é determinado lugar da Itália, é o país inteiro. França também. O Mediterrâneo todo.

Tem um sonho de consumo?

De certa forma, já estou realizando meu sonho de consumo. Tenho uma família linda, que eu amo e, profissionalmente, posso dizer que estou realizado. Faço o que gosto, e as pessoas que trabalham comigo realmente vestem a camisa – não a minha, mas a do paciente, que é o grande popstar dessa história.

Qual característica mais admira em uma pessoa?

Honestidade e gratidão.

Qual qualidade própria mais valoriza?

AAí vou me arriscar a ser presunçoso, porque alguém pode dizer: ‘esse cara não é isso’ (risos). Mas, basicamente, é ser um apaixonado pela vida.

Tem algum ídolo?

Meu pai, um homem que fez a vida em uma cidade do interior e com o qual ainda tenho o privilégio de conviver, com seus 97 anos bem vividos e com saúde.

Se não fosse médico, o que seria?

Provavelmente agropecuarista.

Posts relacionados

Ver mais
.